quinta-feira, 28 de julho de 2011

A IMPARCIALIDADE NO JORNALISMO ESPORTIVO

A IMPARCIALIDADE NO JORNALISMO ESPORTIVO

Por Gilson Alves

No cotidiano de um jornalista esportivo, por vezes o profissional da área se encontra em uma situação complicada. Visto que, em determinadas ocasiões, se depende da permanência de um time em uma competição, para traçar os rumos do futuro das transmissões esportivas e do planejamento do próprio serviço.


Se a equipe ao qual o jornalista acompanha for eliminada, isso pode significar o fim da linha nas jornadas por tempo indeterminado. Porém, uma classificação e um avanço de fase é sinal de algumas rodadas a mais de sobrevida. Muito mais do que uma simples cobertura, o resultado da partida pode estar diretamente relacionado ao futuro do trabalho do profissional. Quanto mais adiante nos campeonatos for o time ao qual o jornalista acompanha, a possibilidade de seguir na ativa e ser remunerado aumenta. Por isso, o profissional se vê obrigado a torcer pelo time de sua cidade. Pode parecer anti-ético, mas devemos nos colocar na situação em que ele se encontra.

Eis então uma questão que entra na ética do jornalismo e que causa grande discussão. Torcer ou não torcer? Como ser imparcial? Manifestar a vontade de que determinado resultado aconteça, não faz parte da ética no jornalismo. Por isso, o profissional precisa medir suas palavras e ficar atento na hora em que expõe sua opinião. Qualquer palavra colocada de forma precipitada pode render interpretações erradas ou por vezes dúbias. Ter toda essa atenção é tarefa nada fácil, em um esporte tão apaixonante como é o futebol.

Teoricamente, o jornalista tem regras a seguir. Construir matérias se isentando de opinião nem sempre é plausível. Até porque a questão é subjetiva. O que um indivíduo considera imparcialidade, pode não significar o mesmo para outro. O conceito sobre esse tema é transmitido ainda na fase da formação universitária, mas a minoria consegue praticar, até pela questão interpretativa, do que é e do que não é ser isento. Mais complicado ainda, fazer isso no país do futebol, onde quase todo mundo se acha no direito de dar “pitacos” sobre esse esporte. Sem falar que a partir da era digital, qualquer pessoa pode criar um blog, ou mesmo expressar suas opiniões nas redes sociais a respeito do assunto que quiser, por exemplo, o futebol.

Ao mesmo tempo, não sendo tão veemente nas considerações favoráveis ao time da cidade ao qual o veículo em que trabalha pertence, existe o risco do jornalista “conquistar” a antipatia do torcedor daquela agremiação, que muitas vezes, defini-o como “secador”. Sem falar é claro, quando a cobertura é feita em localidades onde está presente a rivalidade entre dois ou mais clubes. Nesses casos, a situação é ainda pior, e a cada opinião dada, um ouvinte, telespectador, ou internauta taxa-o como torcedor dessa ou daquela equipe.

Na área do jornalismo esportivo, especificamente nas transmissões, seja de rádio ou televisão, as variantes são muitas. Isso serve também para um setorista de impresso ou on line. Nem sempre o jornalista tem as dimensões do quanto é formador de opinião. Existem pessoas que acompanham o seu trabalho diariamente, gostando ou não. Muitos o fazem apenas para criticar, outros absorvem tudo que lêem ou escutam, como uma verdade absoluta. Desta forma, quem escolhe essa profissão tem de lidar com situações arriscadas, quase que todo dia. Por isso, o equilíbrio e a ponderação nas manifestações são providenciais para um sucesso na carreira. São muitos os casos, onde uma “palavrinha” que seja, mal colocada, ou algo dito por impulso rende um processo e prejudica a seqüência do jornalista esportivo, a exemplo do que ocorre nas outras áreas, só que especificamente nesta editoria, as coisas tomam proporções inimagináveis.

Paralelo a isso, existe outra particularidade, quando se “deseja” algo para o clube da cidade que o jornalista acompanha. O respeito ao adversário do momento é fundamental e o profissionalismo deve estar em primeiro lugar. Mesmo que a vontade seja da vitória da equipe de sua região, pois isso significa mais dias de trabalho, mais ganho financeiro, como fazer isso sem perder a credibilidade e sem de alguma forma ofender o oponente? Esse é um dos obstáculos encontrados pelo profissional que acompanha esporte.

Como então, lidar com a dificuldade de acreditar a todo o momento, na equipe do município ao qual ele representa, sem virar torcedor? Isto é possível? Onde fica a imparcialidade? Será que os jornalistas conseguem ser imparciais? Pois aí que entra a questão de como emitir comentários sobre qualquer assunto, sem demonstrar o ponto de vista, produzindo textos informativos. Naturalmente, ao entrar em determinado tema é esperado até, que se construa a matéria baseada no que se pensa sobre aquilo. Nesses casos, seguindo a ética, o jornalista esportivo deveria demonstrar suas habilidades para construir o texto, dando ênfase a imparcialidade, mas isso nem sempre é possível, pois nesta área, a emoção se mistura a notícia. Separar a paixão, do tratamento que a cobertura jornalística exige é o ideal, só que poucos conseguem realizar esse feito.

A isenção é algo utópico no meio do jornalismo esportivo. Quem gosta de esporte, que aqui no Brasil significa 99% futebol é porque algum dia torceu para um time. E não será ao assumir a função de jornalista que isso será esquecido. E que não venham me dizer que se deixa de torcer ao longo dos anos. De certa forma, concordo que por ofício, se aprende a deixar de “secar”, ter um olhar profissional, mas o amor por um clube faz parte de todo jornalista esportivo, mesmo que ele precise guardar como um segredo esse sentimento a vida toda. E mesmo assim, alguns torcem sim contra os rivais.

O futebol é um esporte que por si só fascina, desperta paixão, amor e ódio. A maior prova disso é que se trocam muitas coisas na vida, seja para buscar o melhor, ou simplesmente para inovar. Porém, o time de coração geralmente não se muda. Ama-se muitas vezes ao longo de nossa existência, mas em meio a tantos “tipos” de amor, aquele mais fiel é o pelo clube, que se aprendeu a gostar quando ainda pequeno. Então, como ser imparcial? Não acredito que alguém consiga deixar toda uma história construída desde a infância, no momento em que passa a integrar o jornalismo esportivo. Pelo contrário, é justamente esse “amor pelo time”, que geralmente impulsiona a entrada do jornalista nesta área.

No meio do futebol, são poucos os exemplos de jornalistas que assumem o time ao qual torcem. Adroaldo Guerra Filho é um dos poucos que declaradamente divulga o clube do coração. E o detalhe está no fato disso acontecer em um “mundinho”, onde se é generalizando, ou gremista, ou colorado. E nem por isso, Guerrinha deixa de ser escalado nas jornadas esportivas como comentarista dos jogos do arquirival. Muitos simpatizantes do Grêmio o elogiam, pois ele entende do “riscado” e opina o que vê, sem fugir do profissionalismo e da imparcialidade. Particularmente, o considero uma exceção. Geralmente, raros são os que fazem isso, por receio de colocar em risco a credibilidade, no momento em revela o time do coração.

Minha grande dúvida, é se existem jornalistas que conseguem separar o torcedor do profissional, na hora do trabalho. Nas jornadas, mesas-redondas, publicações, colunas, etc, seria possível colocar de um lado a razão e do outro a emoção? Para formar minha opinião a respeito deste questionamento, analiso alguns aspectos, exemplificando diferentes praças futebolísticas aqui do Brasil. No Rio de Janeiro e em São Paulo são quatro os grandes clubes. Portanto, o torcedor se divide e então fica mais palpável. Já no Rio Grande do Sul, vejo diferente. São dois clubes, dois estádios particulares, duas Copas Libertadores para cada um e a rivalidade atingiu proporções fora do comum (e não recrimino isso), mas, considero o panorama citado logo acima, como algo perfeitamente justificável, para não se assumir publicamente o clube ao qual se torcia quando pequeno. Esses fatores estão acima de um texto bem elaborado, conciso e independente. Grande parte dos torcedores não iria entender.

A imparcialidade é subjetiva, e sobre a definição do que realmente ela é dentro do jornalismo esportivo, dá abertura a opiniões divergentes e proporciona discussões salutares, porém intermináveis. Em uma transmissão esportiva, as questões extra-profissionais acabam se misturando às atribuições que são de praxe de um narrador ou repórter. E essas atribuições teriam de ser levadas como uma regra, mas falar de futebol é muito mais complexo do que parece. Palpitar é fácil, agora aliar algumas qualidades, que agrade a um público tão crítico é o diferencial. Construir um comentário com conteúdo, objetivo, que aguce a curiosidade do público-alvo e principalmente imparcial é o que se pretende, mas poucos são os jornalistas esportivos que conseguem.

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